segunda-feira, 21 de novembro de 2011

sábado, 12 de novembro de 2011

Tim Wise fala sobre racismo

Sobre racismo. Excelente palestra de Tim Wise.



Quando falamos dos "desprivilegiados" esquecemo-nos que isso é assim por que muitos de nós somo s "superprivilegiados" e podemos simplesmente não nos preocupar com o que os outros passam. Não vivenciamos a carga de tudo que dá errado ser atrelado ao grupo que pertencemos, a cor que temos ou a genitália que possuímos.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Cerveja hidrata, cura câncer e é a panacéia!

mais boas notícias para nós nesta semana:

BRUXELAS - Um estudo apresentado nesta terça-feira, 20, em Bruxelas comprova que o consumo moderado de cerveja após exercícios físicos é tão eficaz quanto a água para a hidratação, segundo especialistas médicos.
Conclusão é de que uma quantidade moderada de cerveja 'não prejudica a hidratação após o exercício'

Conclusão é de que uma quantidade moderada de cerveja 'não prejudica a hidratação após o exercício'

Esta é uma das conclusões apresentadas no "VI Simpósio Europeu de Cerveja e Saúde", onde participaram especialistas em medicina, nutrição e alimentação da União Europeia.


O pesquisador Manuel Castillo, da Universidade de Granada, expôs os resultados de um estudo que consistiu em medir a reação do corpo à ingestão de água ou cerveja após a realização de esforço físico intenso. "Realizamos o estudo para comprovar se o costume de tomar cerveja depois do exercício era recomendável", explicou Castillo.


A conclusão foi de que uma quantidade moderada de cerveja "não prejudica a hidratação após o exercício". Tomar cerveja seria "a mesma coisa que tomar água", por isso é recomendado o consumo da bebida fermentada a todas as pessoas que não tenham nenhuma contraindicação.


"Não foi encontrado nenhum efeito negativo que pudesse ser atribuído à ingestão de cerveja em comparação com a ingestão de água", disse Castillo, que também afirmou que durante as conferências será apresentado outro estudo que descarta que exista "qualquer relação" entre o consumo da bebida e a tendência a desenvolver "barriga de chopp".

O médico Ramón Estruch, do Hospital Clínico de Barcelona, afirmou que os resultados dos estudos mostram que o consumo moderado de cerveja "ajuda na prevenção de acidentes cardiovasculares, graças aos efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios das artérias". Além disso, proporciona proteção contra fatores de risco cardiovascular, como diabetes, melhora a pressão arterial, regula o colesterol e previne a arterioesclerose, segundo a pesquisa.


Estruch informou que atualmente estão sendo feitas pesquisas para determinar se os benefícios da cerveja com álcool são maiores que os da cerveja "sem", embora haja indícios de que a primeira tem efeitos mais positivos. De qualquer forma, Estruch ressaltou a importância de "consumir a cerveja dentro de um padrão de alimentação saudável, preferencialmente a dieta mediterrânea".

Maria Teresa Fernandez Aguilar, pesquisadora da Agência da Saúde de Valência, informou sobre os efeitos benéficos da cerveja sem álcool para as mães lactantes. Ela citou o estudo que demonstrou que crianças amamentadas por mães que consumiram duas cervejas sem álcool durante a lactação têm menos possibilidades padecer de doenças como câncer e arteriosclerose, devido à transmissão dos componentes antioxidantes de bebida.


"Os resultados nos surpreenderam", afirmou Maria Fernandez, acrescentando que a cerveja sem álcool seria mais recomendável que outras bebidas gasosas com base química

http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,estudo-mostra-que-cerveja-hidrata-igual-a-agua-apos-pratica-esportiva,775132,0.htm

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Desacoplando

Dor e delírios e cores que rasgam a carne soltando aromas vivazes de vulvas voadoras que são, no fim, o remédio para o próprio mal inicial. Eu andava novamente flertando com a loucura, saudoso dos velhos dias de seca-garrafa em balcões sebentos de bares com cheiro de cigarro, seguido da intensidade aguda da noite, a intensidade da presença feminina no ambiente, o blecaute total das idéias, para emergir da escuridão com o gosto de terra e sangue na boca, em alguma sarjeta de alguma rua, ou no chão de brita de um bar.
O fracasso é a grande recompensa dos tolos, daqueles ousaram abrir a caixa de marchas do mundo, encarar o ridículo de tudo, das pessoas presas como engrenagens, girando uma nas outras, em busca do torque perfeito, azeitando um motor que nunca lhes trará nada, deixando suas vidas em prol de um outro qualquer que as dirige. O fracasso nos nutre, nos acolhe como uma mãe carinhosa que chama o filho ao peito e sugamos com indecisão no início e logo com mais e mais força.
Para a maioria de nós não existe escolha, temos que, de alguma forma, serrar nossas extremidades e criar dentes que nos encaixem nas demais engrenagens, não importa o quão defeituoso o mecanismo todo já esteja. Alguns podem ainda escolher, titubear perante aquele abismo mecânico, decidindo se dão o passo final ou não enquanto outros, depois que vislumbram o rosto terrível da besta mecânica, jamais conseguem entrar de novo.
A perspectiva muda, a tampa do mecanismo já não parece protetora e confortável como antes, mas sim uma opressora força a nos estrangular. As outras peças que antes víamos como feliz identificação de nós mesmos, agora se parecem monstros deformados, acusando-nos com sua presença nossa própria deformidade.
A vergonha de participar de tudo se torna incorporada de vez no nosso mecanismo, uma peça quebrada, incompatível com o resto. As mulheres são ao mesmo tempo o alívio sensual das dores, o retorno redentor ao animalismo através da atividade mais básica que perpetua as espécies há pouco mais de três bilhões de anos, e constante obstáculo para a felicidade com sua mania fútil de quererem mudar seus homens depois de fisgá-los.
Somos todos seres imutáveis, com superfícies que podem ser maquiadas e modificadas, mas uma estrutura íntima que demora milhões de anos para modificar, evoluir. E no momento o único pedido para a mãe evolução seria mãos em forma de copo tulipa, para agilizar melhor as coisas por aqui.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Animal WIN

1

Espetáculo

Ela costumava me ligar de manhã cedo, oito horas, já bêbada, do serviço dela. Eu estava dormindo, é claro, a secretária eletrônica atendia e ela desligava. Ligava de novo. Desligava. Insistia mais umas duas vezes e, por fim, deixava um recado, chorando, dizendo coisas loucas que eu realmente não conseguia entender, que o mundo era terrível e tal.
Uma hora depois o telefone começaria a tocar de novo, e eu me reviraria na cama, botando travesseiro na cara, tentando não deixar fugir aquele sonho com uma loura alienígena de cabeça piramidal. Desligava. Ligava de novo. Desligava. Por fim ela deixava outro recado no aparelho, dizendo que ouvira uma música incrível, ou vira uma foto linda, e que de repente o mundo ficara algo maravilhoso e ela estava feliz, feliz, e tinha que me ligar dizendo.
Eu não sei como os caras no serviço dela aturavam ou viam essa loucura toda, mas a vida seguia apesar disso, cheia de altos e baixos, uma montanha russa por dia.
Aquilo começou a me afetar aos poucos também, me deixar nervoso e ansioso e irritado, mas a gota d’água foi quando decidimos finalmente ir naquela peça de teatro com aquele ator famoso que precisávamos ver no palco antes que ele morresse de vez.
Compramos o ingresso com um mês de antecedência e ela falava disso dia e noite, dando piruetas, dançando uma música invisível, como uma criança prestes a ganhar um brinquedo incrível.
Chegamos lá e a peça começou e ela estava lúcida e formidável naquela noite e tudo indicava que por um tempo eu teria um pouco de paz dos acessos depressivos dela. A peça era realmente boa e o cara atuava realmente bem, e realmente morreu pouco tempo depois, mas lá pelo meio ela foi ficando com a expressão séria, tensa. Primeiro começou a chorar, depois calou-se. Aí começou a gemer e reclamar do ar-condicionado, do frio. Aí começou a reclamar das poltronas.
As pessoas já olhavam em volta incomodadas e eu tentava em vão contê-la, acalmá-la. Foi aí que ouviu algo no palco que arrebentou uma corda lá dentro da cabeça e ela desatou a chorar, alto, convulsivamente. Os olhos todos do teatro estavam agora voltados para nós, não para o palco, e eu senti que precisava fazer algo.
Eu a puxava para sair e ela se agarrava na poltrona, chorando ainda mais alto. Então, numa pausa de troca de cena, eu pensei, é agora: agarrei-a com força e a arrastei aos berros para fora do local. Não estava no preço do ingresso, mas tenho certeza que foi um espetáculo e tanto a mais.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Ritual

Eu cada vez mais me convenço de que existem quatro tipos de pessoas diferentes no mundo: as lustra-chapeleta, que ficam só chupando a pontinha sem botar o treco todo na boca, as lambe-poste, que ficam com a língua ao redor sem performar a coisa de fato, as garganta profunda, que realmente caem de boca no assunto e se especializam, dão tudo de si, e as que não chupam nem chuparam nunca.
Embora destes o grupo maior fique por conta daqueles na população que nunca meteram a benga alheia na boca, não era com eles que eu estava preocupado. Pelo contrário, para ser um investigador sério na academia eu precisava me focar justamente no grupo minoritário, garganta profunda, como no clássico filme da antiguidade.
Era meu tíquete final para escapar de vez da masturbação acadêmica e entrar em um assunto com mais profundidade, gozaria do prestígio eterno de meus pares se eu pudesse completar minha pesquisa: Metodologia Aplicada para uma Nova Visão Sistematizadora da Prática Felaciadora como Categoria Holística da Coletividade. Era uma verdadeira jogada de gênio, uma teoria que me permitia, de uma só vez, juntar a posição do sujeito moderno no mundo, a prática deglutidora, os lábios da Angelina Jolie, a garganta de Jenna Jameson, os arquétipos jungianos, a psicanálise freudiana e a termodinâmica, tudo numa teoria só.
O sucesso de meu método só pode ser plenamente agraciado ao se ver a extensão que alcançou, pois até mesmo cartilhas de alfabetização chegaram a ser impressas utilizando-se de minhas descobertas, cuja distribuição foi, de última hora, proibida, em virtude de certo coronel Feliciano que se sentiu ultrajado e entrou na justiça para proibir a obra, queixando do capítulo sobre a letra F: Feliciano felaciou com felicidade o falo falso do feroz Felício.
Foi nos últimos dias, quando eu completava minha teoria de forma final, que os estranhos sonhos começaram. Uma porra duma mulher alienígena, de cabeça piramidal, vinha e me felaciava todas as noites. Eu acordava todo melado, sem saber se se tratava de polução noturna ou uma mensagem de seres espaciais.
Por fim, ainda sobre efeito desse sonho que me assombrava, pude defender minha Tese. Pela medição feita na véspera e aquela imediatamente posterior à obtenção do título, percebi que o feito implicou no incremento automático de dois centímetros no tamanho total da minha bazuca. Ávido para comemorar fomos a uma festa noturna onde pude encontrar bela dançarina a quem eu disse: morde essa salsicha, gata!
Até hoje não sei porque disse tal coisa, e tudo a partir daí tornou-se turvo em minha memória, a não ser aquele grito ecoando nos corredores da casa e ouvidos alheios enquanto eu via aquela bela mulher com a boca ensanguentada levando nos dentes meu pedaço de carne. Agora sim eu pertencia ao clube.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Perdendo

O velho cão está perdendo os dentes. Está chegando o fim de seus dias, já não revira mais o lixo e gasta seus dias esparramado no chão em qualquer canto de sol que possa encontrar neste frio.
Ele sente o fim chegando e reage com dignidade e estoicismo, apenas fechando ocasionalmente os olhos numa tentativa de cochilo diurno. Já não passa mais as noites zanzando pelas ruas em busca do seu bando ou alguma cadela no cio. Mesmo depois de ter perdido um dos testículos numa luta com um pitbull ele ainda insistia na procura das fêmeas e as disputava com aquele olhar de quem já provou o gosto do sangue de um outro rival.
O velho cão já não pede mais comida na hora do churrasco e acostumou-se a sua ração cuidadosamente calculada para necessidades calóricas, ainda que um tanto desleixada no preparo quanto ao gosto. Ele já não late mais para o caminhão do lixo quando passa, limitando-se apenas a erguer o olhar e acompanhar de longe a movimentação dos homens que trabalham.
As crianças da casa já há muito cresceram e abandonaram o hábito diário de brincar com ele e ele já não pode mais correr por muito tempo, um desvio na coluna pressiona um nervo e a dor é inevitável. Nas noites frias os rins também doem e ele gane sofrido enquanto sonha que persegue um coelho gigante.
O velho cão já não persegue mais as galinhas, que agora não precisam mais ficar trancadas no galinheiro e andam soltas pelos fundos da casa. Ele sabe que mais dia, menos dia, o dono da casa irá pegar aquele facão afiado nos fundos, ter ele mesmo o trabalho de correr atrás de uma das penosas, cortar-lhe o pescoço, derramando na grama o sangue vermelho enquanto o corpo do bicho corre desnorteado sem um cérebro a coordenar-lhe. Em seguida ele pegará o corpo, jogará água quente e arrancará com rapidez as penas, depois fatiando e assando os pedaços, jogando ao velho cão os restos depois do almoço. Poupa-se assim a correria inútil e espera-se pelos restos e ossos já temperados pelo ensopado.
O que o velho cão não sabe, no entanto, é que o fim dos seus dias pode estar mais próximo do que ele imagina, e que mais dia menos dia o dono da casa irá de fato pegar aquele facão afiado nos fundos, mas não irá atrás de galinha alguma. Ao invés disso irá chamá-lo para uma conversa, acariciar, dizer que sente muito, que gosta muito dele e que é uma pena que tenha chegado a hora. A cabeça cortada num golpe único, morto como se fosse um cão num poema de Sig Schaitel.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Balé em sangue

Um esforço supremo e final antes da morte. O rosto alegre do público acompanhando a dor, o sangue, o medo. A bailarina tem que manter a posição antes que o sangue se esvaia de vez, antes que a luz se apague e a platéia exploda em aplausos.
O desmaio, no entanto, se avizinha. Não um desmaio qualquer, mas o desmaio final, para nunca voltar. A ponta do pé em carne viva já, rígida, mantendo em si todas as forças e tensões friamente calculadas e medos ardentemente deslocados, o corpo se contorce e dói para proporcionar aquele prazer, carne contra carne, espremendo, forçando, pedicando passagem. Uma espécie de frieira se espalha e alastra entre os dedos, apodrecendo a carne, trazendo a dor a cada movimento mínimo, como uma agulha em brasa que queima e dilacera.
O espetáculo é bizarro, ela sabe, ainda assim aceitou seu papel e se preparou e treinou a vida inteira para estar ali, morrer em frente aquele público em seu momento de auge e êxtase. As pernas são perfeitamente modeladas, fortes para o salto e flexíveis para os amplos arcos e movimentos. As coxas sussurram palavras doces enquanto a melodia da dança toca, enaltecendo os quadris e o ventre, que giram de forma inebriante. Os braços são longos como se pudessem alcançar as paredes e os queixos caídos dos presentes. O rosto é frio e rígido, como de quem executa uma curva em alta velocidade, um lançamento de foguete, ou qualquer manobra de alta precisão, deixando escapar de vez em quando um sorriso de malícia, que acompanha o rebolado.
Ela sente a última gota de sangue cair e sabe que não há mais como adiar a morte. Respira o ar que só o pulmão dos mortos sabe inalar e salta ao ar com energia irreal, impossível, como um zumbi a bailar em comercial de lingerie. Abre as pernas em arco exibindo a forma perfeita do salto final.
O povo aglomerado explode em aplausos e gritos e brados e pulos e ímpeto e emoção enquanto aquele corpo se lança ao ar para cair no piso já sem vida, inerte, como um saco de batas ou trinta quilos de picanha prontos para o churrasco. O aplauso se estende por um momento de eternidade comemorando aquela transcendência da arte, a transição artística da vida para a morte, a poça de sangue que escorre pelas tábuas do palco alimentando as crianças que brincam embaixo.
Dou a última tragada em meu charuto cubano e confiro a máquina fotográfica para ver se as fotos ficaram boas e tudo está perfeito. Fotos em tom vermelho sangue, melhor impossível. Dará uma ótima sessão de slides para a família.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

A fada da família

É engraçado como os acontecimentos da primeira infância se embaralham e ficam confusos. Lembro como se fosse hoje, eu tinha cinco anos, e despertei com o barulho na sala, um barulho alto, de algo caindo. Olhei lá de cima e vi o vestido rosa da minha mãe, que ela há tempos não usava, enormes asas de fada, muita maquiagem e purpurina naquela figura esguia que fugia furtivamente tentando não ser detectada.
Cresci por um bom tempo com aquela ilusão infantil, efeito misturado da embriaguez do sono com a fantasia infantil, que me levou por muito tempo a acreditar em fadas, jurando mesmo na escola que eu havia visto uma e me metendo em boas brigas por causa disso.
Nem ao menos as meninas, com toda aquela loucura de fadinhas cor-de-rosa e pôneis voadores acreditavam em mim e, como toda fé, quanto mais irracional e improvável a coisa se tornava, mais eu me aferroava a ela como uma crença indispensável, como verdade oculta, revelação.
Foi aí que eu comecei a pré-adolescência, quando se perde os medos da infância, deixando também as crenças e fantasias para trás, até a compreensão completa de que a fé é o veneno da razão.
Calhou de num dia desses eu estar sozinho com minha mãe numa daquelas festas de família que acabam cedo demais. Começamos uma conversa animada e, enfim, me abri com ela, confessando: sabe, por sua culpa, acreditei por muitos anos em fadas. Como assim?, ela perguntou.
Lembra aquela noite, nas férias de julho quando eu tinha cinco anos? Pois bem, uma noite eu acordei com o barulho e vi o que você estava fazendo de noite, reconheci aquele seu velho vestido rosa comprido que você raramente usava e vi quando você se esgueirava para fora de casa, toda vestida de fada, cheia de maquiagem e perfumes. O que foi afinal aquilo? Para onde você ia?
Minha mãe olhou para mim inicialmente com uma expressão de dúvida que logo acendeu uma faísca de compreensão e transmudou toda a face em terror e tristeza, fazendo-a esconder o rosto envergonhada.
Eu jamais esperaria tal reação dela, pois não achava que havia algo demais na história. Mas logo ela recobrou o fôlego e em desespero me fez repetir de novo o que vira, cinco ou seis vezes, em todos os detalhes. Por fim, ela disse: naquelas férias, meu filho, eu viajei, estava cuidando de sua avó doente, era seu pai que estava com vocês, agora entendo porque aquele vestido alargou e não me servia mais. Papai é uma fada?, perguntei, confuso, ao que ela respondeu apenas com um resmungo de irritação.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Pif Paf Bang

Tudo é cor e som e ritmo e violência. Como uma luta de boxe, é preciso manter a base, mover os pés rápidos, avançar, recuar, nocautear. Esquiva, finta, soco. Pif, paf, bang. Num segundo o adversário está ali, no outro está na lona, gemendo. No mundo de hoje, todos são adversários prontos para levar o nocaute, é preciso apenas não perder o ritmo, esquiva-finta-soco, esquiva-finta-soco, pif-paf-bang.
Nas ruas acidentadas da cidade, com crateras de rali, a competição é selvagem, é preciso chegar primeiro, seja lá onde quer que se esteja indo. Há o sujeito que não sabe mais o ritmo da dança e está prestes a perder a luta. Ele não reduz a velocidade e dobra a esquina, ele pára o carro, praticamente estaciona na pista, e espera uns cinco segundos por uma revelação divina ou epifania íntima que o leve a colocar novamente o veículo em movimento e fazer a conversão. O mundo não pode esperar cinco segundos, não mais, a vez dele chega de ser eliminado, pif-paf-bang.
Tem o sujeito na fila do almoço que não consegue decidir se pega 123 grãos de arroz ou 124. Ele pega meia colher, põe um pouco no prato, volta a colher, muda de idéia, pega mais um pouco, dessa vez enchendo bem a colher, mas despeja somente alguns grãos. A fila de famintos atrás dele cresce e o furor da turba se soma à umidade do dia chuvoso. Algo está para acontecer, um linchamento é inevitável, pif-paf-bang.
Nos dias de pressa, acordar e sair, matando a ressaca com um xícara grande de café preto, sem açúcar, o mais amargo possível, pois de doce já basta a vida. O estômago protesta e revira. E almoço suprimido por uma reunião de negócios é a gota d’água, a ofensa final contra o organismo cansado de guerra. A úlcera estoura e o corpo cai ali mesmo, contorcendo de dor, gritando, deixando vazar um fio de sangue pela boca, pif-paf-bang.
O lutador está cansado, não pode baixar a guarda, não pode se contentar em vencer uma luta, é preciso vencer todas até chegar ao título. Mas uma hora ele se distrai, um segundo qualquer e a porrada vem, o supercílio rompe e o olho enche de sangue, ele tenta resistir, mas sabe que é apenas questão de tempo, pif-paf-bang.
No supermercado, fila longa demais, é preciso manter o espírito guerreiro, não descuidar. É na hora de pagar que o olhar me trai e se volta a um pacote balas. O inimigo não perdoa, a luta é cruel, sinto o cano metálico e ouço apenas um clique seco seguido de estouro antes dos meus miolos voarem nas compras, pif-paf-bang.

domingo, 10 de julho de 2011

Criogenia

Frio. Frio, até entorpecer o cérebro. Frio até congelar os neurônios. Frio até o zero Kelvin, quando a energia cessa, quando não é possível sequer um decaimento de átomo de plutônio ou o salto de um elétron e o próprio tempo pára, congelado. Frio, em suma, como nos últimos dias.
Acho que é a idade, não sei, mas a cada ano parece que o verão é mais quente e o inverno mais frio. O termômetro me desmente, é apenas meu corpo que está dando mostras do cansaço na luta contra o clima, as estações de ano passam atropelando a todos nós, sem que possamos fazer qualquer coisa.
Primeiro são as pontas dos dedos das mãos e dos pés, e logo os pés e mãos que estão inteiramente gelados, insensíveis, inutilizáveis. Uma dor genérica e inlocalizável vai se espalhando pelo corpo todo, juntas, membros, ossos, pele, tudo parece doer e reclamar ao mesmo tempo ao cansado organismo.
O cérebro, não menos espoliado, começa a sofrer a sobrecarga das reclamações que chegam dos mais variados setores do corpo, sem dar conta mais de recursos e alternativas para resolver todos os problemas. Ele mesmo começa então a operação de desligamento, frio excessivo e sobrecarga no sistema, é o que alega, e já não conseguimos mais nos orientar direito, falar, pensar, ter qualquer resquício de esperança ou humor. Nem o sol, aquele desgraçado, se atreve mais a aparecer para esquentar um pouco o dia, ficando às vezes semanas escondido atrás das nuvens.
Frio. Frio como nos cinco minutos entre a vida e a morte aprisionados embaixo do lago congelado. Frio como nos últimos momentos do alpinista que achou que a neve estava firme e não haveria avalanche. Frio como o olhar de uma mulher quando passa por você no dia seguinte àquela confusão. Frio que espeta como faca.
Por fim a solução drástica chega. Garrafas de água quente bem tampadas para esquentar a cama, as roupas, tentar aquecer o ambiente com fogo, eletricidade, atrito, qualquer meio possível, nada adianta. Entro enfim embaixo de um banho, mas nem a água esquenta o suficiente. Fico lá encolhido num canto, choramingando, com a água no mínimo, quase pingando, para que saía fervente e escalde a pele. Minha vida passa pelos meus olhos. Quanto tempo assim? Horas, dias, meses? Não sei.
Passam eras até o calor aquoso finalmente alcançar as engrenagens mais profundas do meus organismo e apertar o botão. Reiniciar a máquina. Sinto o ar encher novamente meus pulmões e aos poucos me descubro novamente vivo.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Justiça manda interromper libertação de trabalhadores no MS

Tem horas que parece que todo o dia é primeiro de Abril. Olha só que tipos de coisas a "Justiça" é capaz de fazer. Tirado do Blog do Sakamoto:

"Justiça manda interromper libertação de trabalhadores no MS

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A juíza Marli Lopes Nogueira, da 20ª Vara do Trabalho do Distrito Federal, atendeu a um pedido de liminar em mandado de segurança movido pela Infinity Agrícola suspendendo um resgate de trabalhadores em condição análoga à de escravo em uma fazenda de cana no município de Naviraí, Estado do Mato Grosso do Sul. O grupo móvel de fiscalização, composto por auditores do trabalho, procurador do trabalho e policiais federais, estavam retirando 817 pessoas – das quais 542 migrantes de Minas Gerais e Pernambuco e 275 indígenas de diversas etnias – por estarem submetidas a condições degradantes de serviço quando veio a surpreendente decisão da juíza.

Marli suspendeu, inclusive, a interdição das frentes de trabalho, imposta pelo Ministério do Trabalho e Emprego, uma vez que os cortadores não contavam com banheiros e enfrentavam jornadas sob a chuva em uma temperatura inferior a 10 graus Celsius. Segundo a decisão judicial, os auditores extrapolam “os limites de sua competência ao interditar os trabalhos do corte manual de cana em todas as frentes de trabalho da propriedade e ao determinar a rescisão indireta dos contratos de trabalho, quando poderiam apenas propor as ditas medidas”.

Por fim, ela concordou com a tese da empresa de que “a interdição está causando prejuízos irreversíveis, já que desde a data da interdição a cana cortada está estragando e os trabalhadores e equipamentos estão parados”. E proíbe, inclusive, que a Infinity venha a ser relacionada na “lista suja” do trabalho escravo, cadastro do governo federal que mostra os empregadores flagrados cometendo esse crime.

Segundo o procurador do trabalho, Jonas Ratier Moreno, que acompanha a operação, a Justiça ignorou o laudo técnico que aponta as condições degradantes que fundamentaram a interdição das frentes de trabalho em sua decisão. “Os trabalhadores estavam uns farrapos. A empresa não oferecia nem cobertores diante do frio”, afirma. Jonas afirma que essa decisão impede que o Estado brasileiro exerça suas funções.

De acordo com Camilla Bemergui, coordenadora da operacão, a Força Nacional de Segurança e a Polícia Federal se deslocarão até o município para comunicar aos trabalhadores, que já estavam parados desde o início da fiscalização há uma semana, que a rescisão indireta dos seus contratos, o que obrigaria a empresa a pagar os direitos trabalhistas, não mais acontecerá.

De acordo com a coordenadora da operação, a Infinity já havia sido inserida na “lista suja”. Em dezembro de 2010, a empresa passou a figurar nessa base de dados por conta de uma libertação de 64 trabalhadores em outra usina de cana do grupo, em Conceição da Barra (ES), ocorrida em 2008. Porém, conseguiu uma liminar judicial retirando-a da lista em fevereiro deste ano. O governo está recorrendo dessa decisão.

Em outras palavras, por força de decisão judicial, os trabalhadores terão que continuar nas condições consideradas precárias pela fiscalização ou irem embora, abrindo mão de seus direitos. A Advocacia Geral da União está atuando para derrubar a liminar.

É esperado que ocorram contestações judiciais após operações de fiscalização, mas cancelar as atribuições do Estado durante uma operação é raro. Qual o próximo passo? Decisão judicial para evitar fiscalizações?"



Justiça manda interromper libertação de trabalhadores no MS

quarta-feira, 6 de julho de 2011

E o romantismo era muito mais interessante que a chatice ensinada nas escolas...

Trecho do Elixir do Pajé, poema de Bernanrdo Guimarães (1825-1884)... se dessem esse poema dele ao invés de torturar os alunos com escrava isaura, literatura brasileira não seria odiada por 11 em cada 10 alunos de ensino médio...


Feliz caralho meu, exulta, exulta!
Tu que aos conos fizeste guerra viva,
e nas guerras de amor criaste calos,
eleva a fronte altiva;
em triunfo sacode hoje os badalos;
alimpa esse bolor, lava essa cara,
que a Deusa dos amores,
já pródiga em favores
hoje novos triunfos de prepara,
graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!

[...]

Vinde, ó putas e donzelas,
vinde a mim abrir as vossas pernas
ao meu tremendo marzapo,
que a todas, feias ou belas,
com caralhadas eternas
porei as cricas em trapo…
Graças ao santo elixir
que herdei do pajé bandalho,
vai hoje ficar em pé
o meu cansado caralho!

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-viagra-de-bernardo-guimaraes

terça-feira, 5 de julho de 2011

Cada vez mais difícil distinguir jornalismo e máfia...

http://edition.cnn.com/2011/WORLD/europe/07/05/uk.phonehacking/

Journalists hacked missing teen girl's phone, lawyer charges

London (CNN) -- Journalists hacked into the phone messages of a missing girl, deleting some to make space for more and thus giving her parents hope she was still alive when she was dead, the parents' lawyer told CNN on Tuesday.

"The family are completely horrified. They thought this was all over" after the disappearance of Milly Dowler in 2002 and the conviction of a man for her murder this year, lawyer Mark Lewis said.

But in April, police told the Dowlers that journalists had hacked into their phones and those of their daughter, he said.

The accusation is the latest twist in a long-running scandal involving media baron Rupert Murdoch's flagship Sunday British tabloid newspaper, the News of the World.

The paper has apologized for hacking into the voicemails of celebrities and politicians, paying compensation to actress Sienna Miller and offering money to others.
Inside botnets and hacktivists
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* Rupert Murdoch
* Hacking
* News Corp.

But the Dowler case is the first time the newspaper is accused of interfering with a police investigation.

British Prime Minister David Cameron on Tuesday called the allegations "quite shocking" and urged the police to investigate thoroughly.

A former top tabloid journalist Tuesday called the allegations "a step change."

"Before we had hacking of celebrities and politicians, but here we have the interference of a murder inquiry involving a 13-year-old girl," said Roy Greenslade, a former editor of the Daily Mirror and an assistant editor of the Sun, a sister paper of News of The World.

"Outside of the political elite in Britain, this story has had little traction until now. The allegations about the hacking of Milly Dowler's phone has the potential to change that," Greenslade said.

Police Monday declined to say whether Milly Dowler was among the victims of phone hacking.

Executives from Murdoch's News International met with British police Tuesday over the claims, the company told CNN.

One of the top company officials told staff later that it was "almost too horrific to believe that a professional journalist or even a freelance inquiry agent working on behalf of a member of the News of the World staff could behave in this way."

Rebekah Brooks, who was editor of the paper at the time of the alleged hacking and is now chief executive of News International, told staff she was "sickened that these events are alleged to have happened."

She said she had contacted the Dowlers on Tuesday "to assure them News International will vigorously pursue the truth and that they will be the first to be informed of the outcome of our investigation."

Brooks asked Lewis, the Dowler lawyer, to show the company any evidence it had "so we can swiftly take the appropriate action."

She said News International was cooperating with police investigations.

CNN obtained a copy of the e-mail Brooks sent to staff on Tuesday. News International confirmed it was genuine.

Brooks acknowledges in the message that there is speculation she might resign, but said she was "determined to lead the company to ensure we do the right thing and resolve these serious issues."

At least five people have been arrested in connection with phone hacking investigations this year since a new investigation, Operation Weeting, was launched in January.

A journalist and a private investigator working for the News of the World were sent to prison in 2007 for hacking into the voicemails of royal staff in an earlier investigation.

Police launched the new investigation this year in response to widespread complaints from politicians, celebrities and other high-profile figures who fear they have been targets.

News International has apologized for unspecified cases of phone hacking. They say they have been cooperating with police since the new investigation was launched in January.

The Sunday tabloid newspaper in April offered compensation and "apologized unreservedly" for the "unacceptable" hacking. It did not name the victims.

News International owns the News of the World, plus the Sun, the Times and the Sunday Times in Britain.

Murdoch's media empire also encompasses Fox News, the Wall Street Journal, the New York Post and Harper Collins publishers.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Julgamento

Passei a semana inteira tenso, nervoso. Por um azar do destino eu fora arrolado como testemunha num julgamento e aquele papel me incomodava mais do que eu haveria de supor.
Na noite da véspera foi quando a coisa começou a piorar. Tremedeira, suores, insônia, aquelas dores e barulhos abdominais a que logo seguiram uma corrida ao banheiro. Depois outra, mais outra, a madrugada inteira me esvaindo em diarréia. O que havia comigo? Era como se eu fosse o réu, não a testemunha. Amanheci pálido e evitei comer qualquer coisa para estar de estômago vazio quando o juiz me chamasse.
Entrei na sala escura do tribunal. Um dia chuvoso e triste de inverno e eu tentava pensar em algum jazz de Miles Davis para me acalmar. Meu estômago agora furava e revirava como se eu houvesse engolido um ouriço vivo que tentava a todo custo sair. Talvez outro bicho. Maldita marmota marretando.
O juiz me chamou para falar e eu sabia que não iria resistir à pressão. O réu era um banqueiro que andara aplicando golpes na praça e eu sabia que as chances de ele ser punido eram realmente mínimas.
Sentei-me olhando para o chão e tentando disfarçar o colapso que se avizinhava. Senti aquele movimento nas tripas descendo, descendo, descendo, abrindo passagem de forma imperativa. Eu torcia para que fosse ar, para que eu não me sujasse todo ali, em pleno tribunal.
Segurei o máximo que pude, com todas minhas forças, suando, quase chorando baixinho, enquanto o cretino do advogado do réu não parava de falar, talvez percebendo minha situação e me manipulando, prolongando tudo aquilo para me desestabilizar. Era um crápula experiente, perito em destruir testemunhas.
Senti que não conseguia mais segurar e fui deixando escapar aquela bola de gás tóxico lentamente, para evitar qualquer barulho que me denunciasse, como eu aprendera em muitos anos na infância de ônibus matinal lotado para escola.
A venenosa bola de metano e aromas pútridos instalou-se então no ambiente, imediatamente sufocando e tomando conta de todos que ali estavam. Todos disfarçavam as caretas de horror e pânico que súbito os tomava e, embora eu tivesse sucedido no silêncio, era óbvio para todos ali que vento mortal partira de mim.
O juiz, num laivo de ironia, disse que algo não cheirava bem naquele caso. Explodi em raiva, e disse que podre mesmo era justiça brasileira que soltava rico e prendia pobre. Levantei e parti dali, surpreso por ninguém me obrigar a voltar.

sábado, 25 de junho de 2011

Leicester é a primeira cidade atacada por zumbis

chamo atenção para o link em destaque na aba temporária:
Zumbis atacam cidade da inglaterra

A questão

Suponha que você receba 500 pila por mês e precisa gastar um real a mais para seu filho ir à escola. O que você faz? Gasta o um real por mês ou deixa seu filho meses sem aula?
A pergunta pode parecer absurda, eu sei, porque qualquer um que não se dispusesse a gastar um real a mais de um salário de 500 e deixasse seu filho sem escola logo seria preso por negligência. Mas, vejam só, é exatamente isso o que o governo vem fazendo e assistimos calados. O orçamento catarinense do ano passado foi de 13 bilhões e toda a questão da greve é em torno de uma bagatela de 24 milhões, ou seja, meio milésimo do orçamento do estado.
Bem, meio milésimo não é realmente muita coisa, o que nos permite afastar de vez a questão econômica do centro da briga que o governo trava há décadas contra professores. De fato, o governo poderia até dobrar os salários dos professores que mal faria cócegas no orçamento. Do total do orçamento, 2,5 bilhões vão para a educação, mas só 600 milhões viram salário mesmo, outros 400 milhões vão para os inativos e os restantes 1,5 bilhões simplesmente somem.
Somem sem explicação.
Somem em compras e obras de licitações obscuras, cujos vencedores nunca são amplamente divulgados, prováveis doadores de verba na campanha eleitoral. Não deve ser novidade para ninguém que o orçamento da educação é uma verdadeira máquina de fazer dinheiro para os partidos. Conheço gente que foi diretor de escola no tempo em que o cargo era eleito e o que acontecia era que o diretor pedia uma obra de 50 mil e vinha uma ordem de serviço de 500 mil. Aí o diretor cancelava, porque sabia que a coisa estava superfaturada e vinha a chantagem do governo, ou você aceita, ou a escola fica sem a obra. Então o governo acabou com a eleição para diretores porque isso inviabilizava o caixa dois dos partidos, agora cada escola tem um membro de partido na direção, para garantir o sigilo nas contas.
Outra experiência marcante foi um colega que trabalhava numa firma prestadora de serviço para a secretaria de educação e que em todos os orçamentos para o governo era preciso multiplicar por seis o resultado final, para pagar as comissões de propina em vários escalões. Ou seja, uma colocação se privada que deveria custar 350 pila, saía por 2000, e assim vai. Devo confessar que tive a honra de pessoalmente conhecer o vaso sanitário que custou dois mil em uma escola.
Nem peço que não roubem, seria demais, eu sei, apenas que diminuam em 10% o roubo. Já faria sobrar muito dinheiro, duplicaria talvez o orçamento da educação.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Em eclipse

Essa semana o sujeito ia subir na sua moto estacionada na Trindade e encostou um fulano, meteu uma arma no ouvido, mandou passar as chaves e sair fora. Levou a moto assim, na grosseria, sem nenhuma explicação ou motivo, esses vêm somente depois dados por criminologistas ou sociólogos.
O caso lembra o de uma mulher assassinada na mesma região e no mesmo horário há cerca de dois anos quando seu carro era roubado. É o mesmo sujeito que rouba? É outro que vem depois e age igual? Não faz diferença, a reprodução do crime já alcançou escala industrial, uns sucedem os outros como clones numa fábrica.
A polícia? Ah, sim essa está muito ocupada fechando bares de madrugada e não tem efetivo para patrulhar as ruas, pois segundo eles a culpa dos crimes é dos bares, não tem nenhuma relação com sujeitos perambulando por aí com arma em punho pela cidade em plena luz do dia.
Ano passado, a três quadras dali, foi a vez de um senhor que foi sequestrado por três caras enquanto saía de casa. A região tá virando uma maravilha, como se vê.
A coisa tá tão ruim por aqui que nem o eclipse vingou. O dia, que tinha sido bonito, foi ficando cinza e fechando o céu, nublando mais principalmente no horizonte, justamente com o firme propósito de tapar o evento e impedir sua observação. Caía um vento gelado e eu subi um dos morros da cidade só para tentar, com alguma sorte, ver alguma parte da coisa, em vão.
À princípio estranhei só ter eu lá no ponto de observação, mas depois entendi que o resto das pessoas era esperto o suficiente para perceber que com aquele tempo seria impossível qualquer esperança. Eu estava lá, mas não por esperança, apenas teimosia mesmo, como se minha teimosia pudesse arrumar o clima ou o comportamento da humanidade e permitir que o fenômeno lançasse seus raios vermelhos tênues sobre a cidade.
É isso então que me resta, a solidão da colina, o último a acreditar na possibilidade de o tempo virar. O último a ter alguma esperança, logo eu que sempre fui o mais pessimista. Não é o eclipse, é a humanidade, ninguém acredita que melhore. Antigamente se inventava boas desculpas para ir à guerra, hoje em dia nem mais isso se dão ao trabalho, apenas dizem claramente, estamos em guerra contra país tal e continuaremos bombardeando até matar fulano.
Já não interessa mais a ninguém. Podemos deixá-los matando e roubando outros países enquanto nos ocupamos de nossa vida e daqueles que estão nos matando e roubando aqui nas ruas cotidianamente.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Sangue Livre

Na primeira facada o sangue jorrou manhoso, devagar, como quem recebe uma notícia inesperada e vai aos poucos acordando. Foi quando veio a segunda que a lâmina realmente cravou firme na barriga e senti as vísceras se enroscando e revirando, como víboras em festa, trazendo um jorro de sangue liberto que via pela primeira vez o mundo exterior e o saudava com sua vermelhidão escura e forte.
A adrenalina na hora ajuda a amenizar a dor, mas a gente sente do mesmo jeito, dói até tontear. Depois da segunda veio a terceira, a quarta e não sei mais quantas, além da paulada na cabeça que me desacordou de vez.
Era isso então? O fim? Uma nota talvez amanhã no jornal e, quem sabe, uma manchete escandalosa no jornal da tevê enquanto as pessoas almoçam e escorre o sangue da tela? Posso até ler na minha frente aquelas piadinhas típicas de coluna policial “vagabundo ia chupar um sorvete e acabou chupando uma lâmina de punhal paraguaio”. Ou quem sabe aquele outro jornal da tevê que outro dia irrompeu no meio da programação com a notícia bombástica e a apresentadora fazendo mil caretas de reprovação e indignação com o estupro cometido por um político famoso, quando ano passado ajudou a abafar e silenciar um caso ainda mais cabeludo de estupro de menor perpetrado por ninguém menos que um dos filhos do patrão. Ah, essa nossa tevê, e depois dizem que cada um tem o que merece.
Será que é isso? As facadas... talvez, de alguma forma, merecidas, como punição kármica por aquela aula que matei no colégio ou aquela menina cujo coração destruí (ah, ok, aqui foi o contrário, na verdade, mas vamos fazer de conta que foi assim para melhor efeito poético).
Não. Nada disso. Nada de karma. Nada de luzes brancas para eu ir. Nada de vozes sussurrantes. Nada de mil virgens. Nada de fogo e desespero. Nada de nada. Apenas o fim, aquela entidade matemática me aguardando de forma confortável e paciente, a inexistência.
Acordei dez anos depois do coma. Os parentes que eram criança já eram adultos, Claudia Schiffer tinha virado uma desconhecida, Kurt Cobain tina se matado, Bukowski tinha morrido, Allen Ginsberg tinha morrido, William Burroughs também, apenas quatro meses depois de Ginsberg. Só eu é que não.
Ou talvez sim. Porque ninguém que passa por uma tragédia sobrevive realmente a ela. Se não morremos mesmo, saímos sempre mudado, de forma que aquele antigo eu jamais se torna recuperável, para sempre perdido, morto, condenado à inexistência.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Degustação

Há poucas cenas na vida que valem a pena guardar na memória até a morte. Aquela noite, por exemplo, em que você entrou no dormitório feminino e ficou conversando com 20 garotas usando lingerie ou camisolas. Aquela garota sensacional que passou por você na rua e você nunca mais esqueceu o olhar dela. Ou aquela noite que tudo funcionou como devia e você usou truques que ela jamais resistiria: vinho chileno e salada mista, que sempre a faziam rir. Como eu gostava daqueles dias e tentava prender cada minuto e cada imagem na minha memória, cada firme e gigantesca imagem.
Não sei porque, depois daquele dia, uns outros rapazes falavam da beleza das formas dela e deixei escapar aquela frase um tanto piegas, de que ela era feita de mármore. Eu me referia é claro à perfeição de formas como se fossem especialmente esculpidas, mas a versão que acabou correndo de boca em boca e consolidando o apelido fatal cuja autoria me fora injustamente atribuída foi “bunda de mármore”, o que me custou para sempre aquela menina que era tão promissora.
Apenas a imagem ficara, preservada em algum recanto obscuro da memória, por décadas e décadas a fio, esperando que algum dia um evento desencadeasse seu ressurgimento. Uma topada numa pedra, um espirro no ofuscamento do sol ou um momento de devaneio ao banho, não sei ao certo, e lá me veio de novo, tal como se fosse presente imediato, aquela imagem tão bem preservada e por tantos anos ocultas: eu, ela, a tensão, o vinho, a salada mista, os risos.
Tive que me segurar acometido pela vertigem do passado que me tragava e trazia à tona os cheiros, os tons de luzes, as sombras, texturas da pele. Fui tomado por uma enxurrada de memórias de um grande acervo que eu julgava para sempre perdido, ou sequer sabia existirem.
Magnífica máquina de realidade virtual que nosso cérebro se torna e nos permite enganá-lo, vivenciar a posteriori um momento tal qual na ocasião em que o mesmo acontecera, apenas, talvez, um pouco embaçado, com alguma informação ou outra faltando aqui e ali, uma foto antiga que parte já se apagou com o tempo. Traiçoeira habilidade, no entanto, que às vezes nos assalta assim de improviso, gratuitamente, e força-nos goela abaixo a memória que nem sempre é aquela que gostaríamos.
Somos o que pensamos e lembramos, o que nossos neurônios criam ao articular circuitos em sua longa rede elétrica de sinapses, que sempre se impõe, mas de forma gentil, para nos dar a ilusão de controle.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Ferida podre

Eu não sei ao certo quando foi que aprendemos a odiar. Começamos cedo, é certo. Provavelmente algum professor que nos deu nota ruim e marcou pro resto da vida aquela impressão odiosa da escola, do estudo. Pois se uma coisa podemos dizer sobre os catarinenses, é que um estado que paga o segundo pior salário do país aos professores, entra na justiça pra evitar reajuste e, ainda por cima, bônus, é o estado campeão de agressão física a professores em sala de aula, só pode ser entendido na sua relação com o ensino como uma relação de ódio.
Eu não sei quando aprendemos a odiar. Talvez na ditadura, nos tempos cinzentos onde as nuvens da tortura e da delação pairavam em cada canto? Onde foi que erramos? Foram tantas vezes que não sei mais numerar.
Santa Catarina tem um histórico de ódio acumulado aos professores, entra governo e sai governo e a situação só se complicou cada vez mais, o que dá a impressão de que a destruição do ensino público conta com a simpatia do povo, que continua votando nos mesmos escroques de sempre, agora na versão 2.0, nova geração.
Não se trata somente de achatamento salarial. Neste mês correu o país um vídeo que deixou as pessoas indignadas, onde uma professora do nordeste reclamava do salário de 900 reais do seu estado. Indignação nacional justificada, mas para nossa surpresa, nosso estado é ainda pior, paga a infâmia de 600 pila de piso para o professor, e só não paga menos porque logo estaria pagando menos que o salário mínimo. Mas a coisa é muito pior que salário de professores, pois desde que o governo extinguiu a escolha de diretores de escola, o cargo se tornou verdadeiro cabide de emprego de aliados políticos.
Eu estive na barriga da fera, vi as entranhas podres do monstro que se tornou a educação no estado. Em época de campanha era impossível achar alguém trabalhando, pois a diretoria da área, a maioria mulheres de deputados do governo, estavam nas suas cidades em campanha. Só uma diretora empregava os dois filhos e a namorada de um deles que passavam o dia inteiro no bate-papo do computador e ainda tinham o desplante de dizer que não precisavam trabalhar porque tinham costas-quentes. Essas são as pessoas que drenam o dinheiro da educação enquanto professores adoecem e morrem em sala de aula. Essa é a relação do nosso estado com a educação.
Santa Catarina é um estado doente, é uma pessoa cava buracos na cabeça direto ao cérebro, removendo partes essenciais, estrangulando as artérias que oxigenam o pensamento.Somos o ódio ao saber.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Apocalipse Zumbi - O CDC está preparado, mas vc está?

Um website ligado ao CDC (o Centers for Disease Control and Prevention) postou uma interessante matéria alerta sobre emergências e como agir nelas, tendo o apocalipse zumbi como base e elemento motivador.

O texto foi originalmente publicado no blog do CDC Public Health Matters em 16 de maio deste ano, por Ali S. Khan. "Social Media: Preparedness 101: Zombie Apocalypse" faz um pequeno resumo sobre as origens do mito zumbi e suas diversas personificações no cinema, principalmente, as que estamos mais acostumados em que uma infecção misteriosa transmitida por mordidas e contato com fluidos corporais dissemina-se pela terra gerando uma multidão de morto-vivos sedentos de cérebros, sangue e tripas humanas.

A matéria chamou tanta atenção que o site veio abaixo. Não sei quanto a vcs, mas eu vou estocar água, comida, lanternas, pilhas, ataduras, remédios e outros utensílios de sobrevivência. Vou mapear saídas da cidade e postos de apoio, como hospitais, quartéis da polícia e do exército e me preparar para os malditos mortos-vivos. Só preciso agora de uma calibre 12, um bom porrete e um grupo de sobreviventes para me ajudar.

A iniciativa é muito interessante. Um pouco de humor e cultura pop é sempre bem vinda, especialmente se é para dar uma aliviada em assuntos sérios, como é a temporada de furacões por lá e a constante ameaça de epidemias ou mesmo pandemias globais que está sempre pairando pelo ar. Só espero que isso não sirva pra alimentar as maluquices dos que acreditam que o dia do juízo final será neste dia 21 de maio e que para os que não forem arrebatados, sobrará apenas o apocalipse zumbi.

Promessa não cumprida

É uma grande farsa essa coisa de escrever, uma tramóia de assassinato, como nos contos de Poe. Não basta cometer o crime perfeito, é preciso expor a olhos vistos a carta roubada, bater nas paredes até o gato miar ou até que as batidas do coração o enlouqueçam de vez. Poe foi o grande mestre, entendeu todas as sutilezas da arte, por isso mesmo até hoje incompreendido por seus compatriotas.
É quase impossível uma história original se pensarmos nos milhares de anos de narrativa que temos acumulados, embora, ainda assim, muitos não pensem duas vezes antes de reescrever uma coisa banal como um fim de tarde ou um lenço caído, porque a experiência, essa sedutora, é sempre única, é sempre algo pessoal e intransferível daquele que narra, e ele pode passar o resto da vida narrando de mil formas diferentes o mesmo fato na expectativa vã de passar, pela soma das incompletudes de cada texto, a totalidade daquele momento já perdido no tempo. É um labirinto, como se vê, uma armadilha onde podemos nos enredar em uma idéia fixa a aí passarmos a eternidade tentando explicá-la.
Ainda assim, mesmo alertados contra a futilidade do ato da escrita, nos deparamos vez ou outra com um sentimento novo, algo que julgamos nunca ter sentido, uma excitação ou serenidade fora de lugar que parece dar-nos sentido novo às coisas e precisamos registrar. É preciso nomear o desconhecido, o nunca antes sentido, e não se faz boa ciência sem, antes de tudo, uma descrição do objeto de estudo.
Aí é que a porca começa a torcer lentamente seu rabo, pois que para isso é preciso recriar para o leitor todo o contexto, cenário, personagens, ímpetos e emoções que levaram de forma derradeira àquele sentimento novo. Mas isso só se faz se o relato for fiel ao ocorrido, o qual, no entanto, é, na maioria das vezes, do desejo do autor ocultar dos leitores, seja por temor a um marido enciumado ou em nome de uma antiga amizade.
Cai-se assim na pocilga dos cenários fictícios, nomes fictícios, tudo fictício para que o sentimento ou ação autênticos possam ser refabricados para o leitor sem que o mesmo esteja munido de todas as peças que permitam decriptografar aquilo que realmente está por trás do texto.
Imaginem, por exemplo, a situação de ter os testículos acidentalmente esmagados em meio um flagrante de adultério, causando o alívio de com isso conseguir se safar e sair vivo, embora eunuco e com muita dor. Como chamar tal sentimento? Como descrever tal cena? Não ouso sequer mencionar esta história...

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Febre de Outono

Meu avô sempre dizia que o outono era a melhor estação do ano, tinha os dias mais bonitos, o céu limpo, uma brisa fresca. Ainda que eu desconfie de um certo viés na análise dele porque ele havia nascido no outono, e disso se orgulhava, devo admitir que são, de fatos, dias agradáveis. Já estamos chegando na metade do ano e mal sentimos o tempo passar.
O problema do outono, para mim, é o início das gripes e crises de todos os tipos. Outro dia deu-me uma febre de quase quarenta graus e dor estomacal e dormi por dezoito horas, exausto. Acordei melhor, apenas fraco por ficar um dia inteiro sem comer. Sei que eu devia dormir mais, me alimentar melhor, almoçar todos os dias e todas essas coisas, mas parece que o descuido nos hábitos me leva a ser presa fácil das viroses de outono.
Tive o mais estranho dos sonhos nesse sono de 18 horas, como se tivesse tido o mesmo sonho o tempo inteiro, ao invés de uma cadeia de sonhos como normalmente temos. Eu sonhava que meu corpo era uma espécie de concha dura, fragmentada em algumas centenas de pedaços, que precisavam ser colados e montados como um grande quebra cabeça tridimensional. Fosse talvez o delírio da febre ou o exagero de analgésicos, mas podia mesmo sentir as mãos que deslizavam sobre mim encaixando de volta em meu corpo as partes removidas, acompanhadas por sussurros femininos que perguntavam e trocavam entre si as peças para encaixe.
Estivéssemos em outra época ou lugar e eu diria serem súcubus ou as setenta virgens prometidas. Acordei várias vezes sem ar, ofegando, sufocado por um grande peso invisível. Senti que montavam meu baço, meus rins, meu fígado e tudo mais. Credito o sonho ao clima espectral que o outono sempre traz, esses fins de tarde em que as sombras se alongam como mantos à beira do abismo.
Para mim o outono estará sempre ligado ao conto do Ray Bradbury, Cheiro de Outono, que sempre sinto que preciso reler nesses meses do ano. Talvez o conto explique o sonho. Talvez o sonho explique o conto. Ou talvez o delírio febril explique tudo.
Olhando os jornais sinto que não sou eu, mas o mundo que está em febre. Depois de tanta expectativa pela captura e julgamento do Bin Laden, veio o fiasco do século, uma operação desastrada que culminou em uma mera execução com ocultação de cadáver, dentro de um saco com pedras lançado ao mar, no melhor estilo da máfia. O sumiço do corpo é inexplicável, dá a crer que ele esteja vivo em alguma prisão militar. Coisas de outono, certamente.

sábado, 14 de maio de 2011

Conversas com a história: Lewontin

O grande Richard Lewontin em entrevista com Harry Kreisler para a série de entrevistas "Conversations with History" da University of California TV:




A transcrição da entrevista pode ser encontrada aqui.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Isso sim é que era série.

Spectreman é uma das minhas séries favoritas e até hoje me faz ter vontade de visitar Tóquio só pra ver os monstros criados a partir da poluição. Hehehe!



O mais triste é que fui descobrir hoje que Tetsuo Narikawa, o Kenji na versão Brasileira, havia falecido em 2010. Que coisa mais triste. E olha que via a série já nos anos 80 quando o SBT a transmitia às tardes. Odiava quando perdia um episódio ou quando a programação era alterada.

Mas a vida é assim. Nós vamos envelhecendo e nossos ídolos vão morrendo.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Uma saga celulada

Depois de muita resistência resolvi, enfim, ponderar a possibilidade de usar uma dessas máquinas de grudar na cabeça e ficar falando sozinho na rua que chamam de celular. Não que eu esteja mudando, o aparelho é que foi incorporando outros utensílios: agenda, email, despertador, jogos, uai-fai, gps, massagem íntima e guia espiritual.
Mas sou um sujeito chato na hora de comprar algo, indeciso, preciso saber de todas as informações sobre todas as opções até começar a triar e descartar um por um e chegar na decisão final. Comprar meias, por exemplo, é um longo exercício de leitura de etiquetas, pois não compro meias com menos de 80% algodão, o que infelizmente são a maioria no mercado. É indizível a comparação de uma meia com alto teor de algodão com essas porcarias semi-sintéticas que nos empurram em lojas e supermercados e shopping centers, é como comparar um vinho chileno a essas groselhas com cachaça que nos servem nos restaurantes sob a alcunha de vinho da casa.
Então, felizmente para os vendedores, eu já dou uma boa pesquisada nas lojas online e saio de casa com uma idéia mais ou menos sedimentada do que eu quero, de modo que não preciso ver tudo. Um amigo sugeriu que eu fosse num centro de compras onde havia loja de todas as operadoras e, assim, eu poderia sair de lá já com o aparelho e o plano.
Consegui passar incólume pela maioria das lojas, constatando para minha decepção que a maioria dos aparelhos nesse tipo de loja é bem inferior ao que se acha em lojas na internet: são tecnologicamente atrasados por um preço 50% maior. Mas pior ainda do que isso é que os vendedores são, na verdade, vendedores dos pacotes das operadoras, que sabem responder o número de torpedos ou segundos de cabeça pra baixo que você pode falar no aparelho, mas não tem a mínima noção da velocidade de processamento, capacidade de memória, versão do sistema operacional, e outros pormenores não muito técnicos que até mesmo um leigo como eu é capaz de saber.
Tudo que eu queria era ler silenciosamente as especificações de cada aparelho, mas a pobre vendedora insistia em me trazer e montar diferentes modelos, que por algum motivo, decerto minha cara de falido, eram os mais vagabundos. Ela justificava a escolha dizendo que eram os mais vendidos, o que para muitos pode ser sinônimo de qualidade mas, para mim, uma certeza de ser porcaria. Posso não conhecer celulares, mas conheço suficientemente a humanidade para saber que os mais vendidos são sempre o pior negócio possível.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Deu pane

Um dos fatos mais constrangedores recentes, que deve se inscrever nos anais das grandes burradas de nossa política, foi o artigo de certo ex-presidente ex-sociólogo em que recomenda seu partido esquecer o povo e focar na nova classe média. A frase, em si, não causa surpresa, é apenas uma revelação daquele Weltanschauung peculiar que lhe permitiu ferrar o povo durante oito anos em nomes dos ricos, pelos ricos e para os ricos. O que é peculiar, entretanto, é a sinceridade com que pela primeira vez se abandona a máscara, somada ao grande equívoco em sua visão de mundo.
Oras, vejamos, o grande fenômeno chamado de ascensão da nova classe média é que justamente a classe A e B, que somadas detinham a maior parte da renda nacional, foram desbancadas e ultrapassadas pela classe C, que passou a ser a campeã nacional, e, posteriormente, ultrapassada também pela classe D, que com o inchaço dos 30 milhões que saíram da miséria, também ganhou corpo. Essas duas classe, juntas, formam o povo, a identidade da maioria dos nosso cidadãos, de forma que não faz absolutamente sentido nenhum dizer que deve-se esquecer do povo para focar nessa classe média, porque são essencialmente as mesmas pessoas.
A falha seria menor e poderia se ignorar, se não viesse de alguém com formação acadêmica que se propõe a ser nosso grande intelectual de oposição, o que explica porque o governo bate recordes de popularidade e governa hoje, na prática, sem oposição. E não é coincidência que tal falta de idéias novas e falha de perspectiva e estratégia venha à luz justo no momento em que a oposição vai se rachando em todo o país, ninguém quer ficar num barco em que o timoneiro está louco.
O fenômeno não é novo, embora usualmente tomasse lugar em diminutos grupos de esquerda. Isso me lembra as velhas piadas de trotskistas: quantos trotskistas cabem num fusquinha? Um só, porque se tiver dois o fusca racha. Ou ainda a do trotskista e do tijolo, que tinha tanta popularidade no nicho quanto um busto de Napoleão em Portugal, muito utilizado naquelas terras como artefato afrodisíaco, como se sabe.
Mas, como diria Hamlet, é loucura, sim, mas há uma lógica nela. A lógica, ou tentativa, que impele o discurso, nesse caso, é o hábito de gerir a política como se fosse uma empresa. Se a moda empresarial é a nova classe média, lá vai o sujeito fazer um artigo sobre isso. Nome de político passa a ser tratado como grife, o partido é marca. Já vi tentarem isso até em grêmio estudantil. E nem neles nunca deu certo.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Bucetas de Fibonacci

Sempre tive uma tara inexplicável por bucetas. Ainda nem conseguia ejacular a já havia descoberto as maravilhas da masturbação assisindo aos programas infantis da minha época, em que apresentadoras de tanga cantavam e rebolavam músicas gemendo e mostrando aquela bunda e coxas perfumadas para mim, candidato a futuro adolescente.
A coisa toda melhorou quando ela se cercou de um harém de adolescentes loiras que balançavam também os seios e as bundas tornando toda minha infância um grande sonho erótico do qual nunca quis despertar. Ainda hoje, quando ouço aqueles sussurros e gemidos implorando por mim e mandando carícias e suplicas, o resultado é imediato.
Foi Leonardo Fibonacci que apresentou a nós ocidentais a equação que deriva da soma dos dois números imediatamente anteriores, com diversas aplicações no mundo das finanças, jogos e biologia. Foi um amigo biólogo quem me chamou a atenção para a dita fórmula, pois eu conhecia a sequencia mas jamais havia me antenado de como ela surgia.
Foi aí que entendi que as bucetas são também um acontecimento natural que segue a dita fórmula. Quanto mais bucetas você conhece, mais precisa conhecer, aumentando sua exposição de bucetas numa ordem igual a soma dos dois anos anteriores, o que faz com que a adolescência seja um período tão difícil onde a fórmula ainda engatinha em seus termos iniciais.
Mas logo isso é insuficiente e você precisa desenvolver novos usos e aplicações para a misteriosa maravilha da natureza que se apresenta diante de seus olhos e você precisa tocá-la, esticá-la, cheirá-la, lambê-la, esfregar seus corpo nos fluídos que de lá saem até que o cheiro se grude em você, liberando um estágio de excitação contínuo, como daquelas sessões de putaria infantil de seus primeiros anos, onde o desenho animado era intercalado com coxas roliças e bundas saltitantes.
Triste infância hoje, condenada aos canais de tevê a cabo onde nem mesmo se sabe qual animal deveria ser aquele desenho que aparece na tela. Tenho saudades do quáckula, do faísca e fumaça, dos herculóides, de Thundarr, o bárbaro, com as formas e decotes generosos da princesa Ariel, mas foram completamente fadados ao esquecimento ocm o surgimento da tecnologia superior de alternar desenhos com adolescentes sensuais.
Tenho certeza que um dia, quando a soma de todas as bucetas na terra alcançar o numero previsto através de um uso da sequencia de fibonacci, todas bucetas se desgrudarão dos corpos de suas donas e se unirão em uma fenomenal e gigantesca construção de carne, com bilhões de bucetas molhadas, raspadas ou peludas se grudando e pulsando, zunindo, emitindo o barulho ensurdecedor que marcará a evolução do ser humano para o próximo patamar evolutivo, como o monolito sentinela de 2001, uma ódisséia no espaço.
Por esse dia vivo meus últimos fôlegos, esperando a hora em que possa
contemplar aquela gigantesca e avassaladora obra natural, de onde escorrerá em cachoeira os humores vaginais que banharão a terra na construção de um novo mundo, não imaginado nem por coleridge em seu poema sobre Kublah Khan. Ó bucetão, nós morituros te saudamos!

quarta-feira, 20 de abril de 2011

E vamos nós (de novo)

Lá vou eu mais uma vez. Festa de família, aquela multidão de desconhecidos e tios e tias e primos em oitavo grau, a maioria centenários, vindo me cumprimentar e apalpar e abraçar e retirar do túmulo da memória lembranças de mim no peniquinho ou em alguma brincadeira de criança na última vez que me viram, algumas, isto é, várias décadas atrás.
Há quase como que um ritualismo tribal nisso, onde a geração nova deve retornar à campa dos antepassados, ainda vivos, para apresentar a eles a nova safra familiar, a grande riqueza familiar que é uma nova geração exibindo variedade e retomadas da grande melodia genética de uma genealogia.
Como pães quentes e macios as novas crias vão surgindo no mundo, expelidas do ventre materno e deslizando com força pelos órgãos esgarçados em meio a sangue, mecônio e mais meia dúzia de líquidos que nem sei nominar. Vem em cores rosadas, roxeadas, morenas, verdes e toda uma gama de tonalidades a que os médicos logo correm para atestar uma nota, como as que vemos no concurso de patinação artística. As mães podem assim, depois, comparar entre si as crias pelas primeiras notas recebidas no currículo logo ao nascer. Quanto foi a nota no Apgar? E no segundo Apgar, quanto foi? E o teste do pezinho, passou ou rodou?
Embora eu tenha já aceitado minha condição de eremita-ser-anti-social, ainda me obrigo a comparecer com esparsa regularidade, uma vez a cada dez anos, mais ou menos. Não que eu não goste da ocasião, adoro, apenas um certo pânico ocasional que me assola.
O mais estranho mesmo, é ainda me chamarem por apelidos de infância, como Anacreontinho ou, ainda, pior, Creozinho, que já era ruim o suficiente e ficou ainda pior depois do surgimento em nossas belas artes nacionais da Dança do Créu.
Então lá vem eles chamando de Creozinho um aglomerado de osso e carne de quase dois metros e mais de cem quilos, suficiente para alimentar umas cinquenta famílias haitianas durante um mês. Ou um ano.
Mas o bom é que há sempre comilança, saudades saciadas e cerveja em fartura pois, como dizem os teutófonos, das Trinken regiert doch die Welt, o que é um ethos muito mais apreciável que o money makes the world go round, dos anglófonos, embora sendo um bom jogador eu tenha uma queda pela velha frase latina Fortuna Imperatrix Mundi, como no estupendo início de Carmina Burana, tendo aí em mente o sentido de sorte e azar... no meu caso mais azar do que sorte, geralmente.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Reencontro

Era uma merda fodida cheia de sangue mesmo. Eu voltei lá com Selma e Diana na noite seguinte e eu não conseguia tirar Hismena da cabeça. Ela me olhava a cobiçava e procura em meus bolsos chaves e coisas imaginárias que eu sabia há muito esquecidas pela humanidade. Ela tinha os maiores olhos que eu já tinha visto num ser humano, rosto arredondado e cabelos muito loiros, loiros demais para serem de verdade. Ela dizia já ter trepado mais de mil vezes com o primeiro ministro italiano e me apalpava novamente e dizia: piu belo!
Eu estava tentando conter a excitação dentro das calças e tentava seguí-la pelos corredores, que teimavam em se afastar dos mus pés. Eu tentava focar, concentrar, mas é como se eu não conseguisse que meus pés se fincassem no chão, sempre teimando em se sobreelevar e me erguer até quase o teto.
Hismena era criada pelo avô materno, um velho bruto e selvagem que sabia bater com força. Um filho da puta, mesmo. Ela me implorava que eu me escondesse naquele canto mas meus pés teimavam em erguer-me e o chão estava sempre longe e mais longe.
Consegui enfim ficar numa altura mediana quando o velho veio entrando no quarto dela, que tinha as luzes apagadas. Estiquei-me como uma tábua equilibrando a barriga sobre o encosto de uma cadeira de madeira, deixando que meu corpo ficasse ali como pêndulo. O velho aproximou-se lentamente, doentemente, e no escuro deu-me uma pancada forte nas costas, que suportei firme, sem gemido ou murmúrio, enrijecendo a musculatura para que ele achasse ser algum objeto inanimado que não uma trouxa mole de carne humana.
Aos poucos a gravidade, ah, essa cruel e terrível alcoviteira, começou-me a puxar para baixo, forçando-me o equilíbrio e trazendo dores insuportáveis enquanto o velho quase cego ali se demorava.
A promessa de ter Hismena para mim ajudava a me dar força e eu sentia lentamente que o corpo se enrugava e murchava e morria, como um cão em seus últimos momentos antes da injeção fatal.
O velho por fim se retirou do quarto e Hismena veio ao meu encontro e beijou-me, e tirou minha roupa e cravou por fim, em mim, a adaga que me levou de vez o resto de vida que em mim havia.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

A maior invenção do século passado.

Hans Rosling dá uma palestra sobre a maior invenção do século XX, a máquina de lavar roupa e discute sustentabilidade, consumo de energia e o fato de muita gente do 'primeiro mundo' querer dar pitaco em que os habitantes de países pobres podem ou não podem ter e fazer. Mais uma ótima palestra TED.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Caramba, caracho, ein whisky

uma música alemã, trash-metal-western-spaghetti, sobre um sujeito bebendo numa bodega do Rio após ser chutado por uma tal Dolores. Imperdível, botei até a letra pra cantar junto :)



Caramba, Caracho, ein Whisky
Caramba, Caracho, ein Gin
verflucht, Sacramento, Dolores
und alles ist wieder hin

Caramba, Caracho, ein Whisky
Caramba, Caracho, ein Gin
verflucht, Sacramento, Dolores
und alles ist wieder hin

in Rio de Janeiro
in einer klitzekleinen Hafenbar
sass ein braungebrannter Gaucho
mit schwarz-braunem Haar

und um Dolores zu vergessen
die seine liebste war gewesen
sprach er zu Don Filippo,
dem alten Spelunkenwirt

Caramba, Caracho, ein Whisky
Caramba, Caracho, ein Gin
verflucht, Sacramento, Dolores
und alles ist wieder hin

Caramba, Caracho, ein Whisky
Caramba, Caracho, ein Gin
verflucht, Sacramento, Dolores
und alles ist wieder hin

in Rio de Janeiro
in einer klitzekleinen Hafenbar
sass ein braungebrannter Gaucho
mit schwarz-braunem Haar

und er sprach "Amigo mio"
sie war die schönste Frau in Rio
da lachte Don Filippo
der alte Spelunkenwirt

Caramba, Caracho, ein Whisky
Caramba, Caracho, ein Gin
verflucht, Sacramento, Dolores
und alles ist wieder hin

Reunidos

Finalmente estávamos reunidos, os três piores assassinos da história. Tatu Louco gostava de ficar quieto num canto afiando seus 219 machados e machadinhas diferentes, enquanto eu e Saci-sem-braços fazíamos a gritaria e esporro desaconselhável em reuniões desse tipo.
Muitos sempre se perguntaram como Saci-sem-braços poderia ser um dos mais eficientes assassinos de todos os tempos, tendo apenas uma perna e nenhum braço. Os que viveram para saber a resposta em geral não sobreviveram para contar a ninguém, exceto eu e Tatu Louco, que somos os amigos mais chegados.
É claro que metade da fama de matador de Saci-sem-braços ele ganhara por causa do seu apelido, pois enquanto todos os jurados de morte ficavam esperando pelo matador que viria pulando numa perna só, ele se aproximava e matava sorrateiramente, depois se afastando com seus vários braços e pernas antes mesmo que notassem o sujeito morto. Taí, está dito, acabei por entregar o jogo, mas espero que não perca a amizade por isso.
O fato é que Saci andava mal nos últimos dias. Aquele cara da tevê era um amador, ele dizia, não merecia estar em todos os canais, dizia com evidente inveja que o corroia. Eu tentava, pela milésima vez, consolá-lo, enquanto Tatu Louco permanecia em silêncio, emitindo apenas o barulho da pedra deslizando contra a lâmina..
Finalmente chegamos lá, disse Saci retomando a cantilena, esse bando de manés queria que o país fica igual ao esteites, e conseguiram, com uma década de atraso, mas já temos também nosso massacre escolar. Eu o consolava, dizia que não era nada, que o que ainda valia era a habilidade dos matadores da velha guarda, que não faziam esse espalhafato todo, não estavam apenas querendo o holofote fácil da mídia, que nunca se fazia de rogada em ceder.
Ele fez que ia dizer alguma coisa mas, então, um soluço lhe escapou. E então um choro, que durou uns 30 segundos até que ele conseguiu controlar. Um silêncio pesava agora entre nós e ninguém se arriscava a dizer mais nada.
Tatu Louco, lá do fundo, cortou finalmente aquele silêncio de embaraço e constrangimento cantando o hino nacional dos EUA, o “Starspanked monkey banner”. Era de se estranhar aquela demonstração vindo de um cara impregnado por um profundo anti-americanismo. Mas eu sabia, assim como ele, que aquela era uma forma de secretamente me agradecer por ter feito Saci-sem-braços calar-se, uma vez que o título original da música era “Para Anacreonte no paraíso”. Abrimos outra cerveja.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Personas

A literatura tem algumas personagens tipificadas que se repetem com frequência, como por exemplo a criança, que por sua inocência pode dizer aquilo que aos outros não é possível ou permitido, como na história de Hans Christian Andersen sobre a roupa nova do imperador, que é desmascarada pelo grito de uma criança que avisa que o rei está nu. Já o cego, desde as histórias gregas sobre Tirésias, é aquele que por não poder enxergar o presente pode ver o futuro, como no caso do profeta grego, ou ainda descobrir o que está oculto, como identificar o assassino que todos procuram sem sucesso em “M – o vampiro de Dusseldorf”, o filme de 1931 dirigido pelo grande Fritz Lang.
São notáveis certas personagens que se repetem ao longo dos séculos, ainda hoje reatualizadas, como a figura do anão bobo da corte, que pode dizer ao rei em tom de brincadeira aquilo que nenhum outro poderia dizer, ou o sonâmbulo, que em seu estado de sono é permitido ser outro e dizer e fazer coisas que normalmente não poderia. Essa galeria se completa com o bêbado e o louco, que também são figuras que normalmente aparecem na trama para serem aqueles que expelem de si a verdade inconveniente que nenhuma outra personagem pode falar ou admitir, o bêbado por causa do torpor etílico e o louco porque... ora, porque é louco mesmo, afinal.
Vejam vocês, por exemplo, a situação. Você entra no banco, vai até a mesa do gerente, baixa as calças e fica quinze minutos falando todos os impropérios que lhe vem à cabeça. Ora, o resultado seria logo você ser preso pelos seguranças, depois espancado pela polícia, currado numa cela qualquer e ainda processado pelo gerente do banco por danos morais. Agora se você levar seu vovozinho centenário junto e pedir para ele fazer a mesma coisa, ele ficará lá os quinze eternos minutos sem calça falando palavrões que não se ouvia desde o tempo de Napoleão, depois botará a calça tranquilamente e você vai dizer para o gerente: Peço desculpas, vovô tá meio cacuca, sabe como é, não? Aí o gerente irá assentir com a cabeça, ainda assustado, dar um sorriso amarelo e sentar-se novamente na mesa perguntado o que pode fazer por você.
É por isso que depois de tanta reviravolta na política em que se gasta muito esforço para tentar mudar o sistema eleitoral com coisas supérfluas como listas partidárias e voto distrital é que eu, meio criança meio idoso, do alto de minha loucura, cego de dor, com meio litro de vodka na cabeça, anão, digo dormindo: vão fazer algo útil, por favor!

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Foto do dia

Tem dias que são estranhos, em que você sabe que há algo errado, mas não sabe exatamente o que. WTF, bovine equitation?

segunda-feira, 4 de abril de 2011

O chão nosso

Às vezes o chão sobe até a cabeça e nos nocauteia, num giro rápido e surpreendente, como cobra dando o bote. Como toda família de imigrantes exóticos que se mudam para cá, meus antepassados sonhavam em viver num país de cobras, animais selvagens, combates ao amanhecer e tudo mais.
Foi assim que acabei sendo criado no Acre, boa parte dessa criação feita por cobras que me encontraram vagando na rua ainda bebê. Pode até causar certa surpresa o fato, porque estamos mais acostumados com a idéia de outros mamíferos fazendo isso, cães, lobos, tigres, e por aí segue a longa lista, mas podem acreditar na sinceridade quando digo que é melhor ser criado por cobras do que morcegos ou baleias, pois geralmente a criança humana, nessas condições, não resiste ao primeiro vôo ou ao primeiro mergulho de meia hora.
O fato é que dentro de cada um de nós está uma pequena parte do cérebro que se desenvolveu há milhões de anos atrás e que temos em comum com os répteis. Não são criaturas tão alienígenas quanto parecem, quem tem cobras como animal de estimação até jura que elas gostam de ganhar um carinho de vez em quando.
Outra coisa que as cobras têm em comum com muitos mamíferos é sua relação com nomes no contexto social. Nesse sentido as cobras são iguais a gatos, você pode chamar de Xaninho, Piscadela ou Rasga-tripas, que o resultado é o mesmo, não adianta chamar que o bicho não vem. Tanto para um quanto para outro, o mais atrai mesmo é comida, de forma que me arriscaria como etólogo amador a dizer que são na verdade a mesma espécie, embora o gato tenha uma propensão ainda maior que a da cobra de te esperar num canto escuro para então pular em cima de você cravando os dentes.
E mais traiçoeiro ainda do que cobras e gatos pode ser o chão. Num momento você está andando muito tranquilo pensando na beleza do dimofirsmo sexual como uma característica evolutiva capaz de inspirar as vidas dos espécimes fazendo-os gerar tratados de filosofia e literatura, numa bela simbiose entre biologia e arte, quando, de repente, você está com a cara grudada no chão, sentindo a poeira entrando pela sua boca indo até a garganta, sentido os óculos se esmagarem, estalando e arrebentando em várias partes, as pequenas pedrinhas rolando e rasgando sua carne, enquanto o sangue, aquele líquido belo e espesso que a natureza nos deu, mistura sua cor sensual à terra amarelenta, formando um barro quente. Tudo muito lento, como um beija-flor batendo asas uma vez por minuto.

domingo, 3 de abril de 2011

eu não sabia

PQP! Essa é foda.
Eu nem sbia que o scharzenegger tinha deixado de govenador.
daí, duas bombas, stan lee vai fazer um quadrinho chamado The governator onde ele é um herói, e o sucessor que ele fez no governo foi a porra do jerry brown, que governou o estado nos anos 70.
Em homenagem, fica a letra, clássica no bar do francke, dos Dead Kenedys:

"California Uber Alles"

I am Governor Jerry Brown
My aura smiles
And never frowns
Soon I will be president...

Carter Power will soon go away
I will be Fuhrer one day
I will command all of you
Your kids will meditate in school
Your kids will meditate in school!

[Chorus:]
California Uber Alles
California Uber Alles
Uber Alles California
Uber Alles California

Zen fascists will control you
100% natural
You will jog for the master race
And always wear the happy face

Close your eyes, can't happen here
Big Bro' on white horse is near
The hippies won't come back you say
Mellow out or you will pay
Mellow out or you will pay!

[Chorus]

Now it is 1984
Knock-knock at your front door
It's the suede/denim secret police
They have come for your uncool niece

Come quietly to the camp
You'd look nice as a drawstring lamp
Don't you worry, it's only a shower
For your clothes here's a pretty flower.

DIE on organic poison gas
Serpent's egg's already hatched
You will croak, you little clown
When you mess with President Brown
When you mess with President Brown

quarta-feira, 30 de março de 2011

Miguel Nicolelis no The Daily Show com John Stewart

Entrevista do dia 29 de março de 2011 do neurocientista Miguel Nicolelis (Nini para os íntimos) no The Daily Show falando de seu novo livro Beyond Boundaries: The New Neuroscience of Connecting Brains with Machines—and How It Will Change Our Lives:



O que mais gostei foi que o Stewart faz brincadeiras, solta piadas, mas também faz perguntas relevantes e, principalmente, deixa o entrevistado falar. Algo que nem todos os entrevistadores conseguem fazer. São menos de seis minutos de entrevista muito bem aproveitados, interessantes e leves, pelo menos, dado o conteúdo. Claro, o mérito é também de Nicolelis que além de brilhante cientista é um ótimo divulgador das ciências. Estou doido para o livro sair aqui no Brasil e alguém me dar ele de presente. :)

segunda-feira, 28 de março de 2011

AA causa piora no alcoolismo

Caraca, o AA não só é ineficaz no tratamento ao alcoolismo, como ainda tem taxas de racaídas ao alcolismo ainda piores do que pessoas que não fazem tratamento nenhum.
Isso que dá querer trocar álcool por doutrinação religiosa.

Eis as taxas dos que largam o alcoolismo e se mantém em abstinência

TAXAS DE ABSTINÊNCIA
DE CADA TRATAMENTO
9% Alcoólicos Anônimos
10% Nenhum tratamento
14% a 19% Psicoterapia
16% a 21% Medicação
33% a 36% Combinação de medicação e psicoterapia

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-critica-aos-alcoolicos-anonimos

domingo, 27 de março de 2011

É Braziu, ziu, ziu, ziu!

Clique para ver maior.
Brasileiros e latinoamericanos tem maior média peniana, ou maior caradepau em mentir.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Isso é que é vilão (Mais do The Onion)

Despondex: O primeiro 'depressivo' prescrito (via The Onion*, claro)

Se vendesse em spray e o efeito fosse instantâneo comprava uns 20. Seria melhor que spray de pimenta.






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*Se vc não sabe o que é o The Onion, vá descobrir.

Identidades

Recentemente agora teve um canal de tevê fechada que exibiu um docuficção, isto é, um filme ficcional com a roupagem de documentário tradicional. Não foi a primeira vez, na outra o tema fora dragões e nesta o tema foi sereias, dando tratamento aos seres lendários como se realmente existissem. E nas duas vezes a resposta surpreendente do público (ok, nem tanto) foi acreditar que aqueles seres realmente existiam.
Isso é uma preocupação constante de quem produz ficção. O sujeito vê um filme de guerra e vai pro bar bater papo crente que a guerra foi mesmo como no filme. Exemplos recentes incluem a devolução de iraquianos de uma americana ferida, que foi retratada em filme como se ela fosse resgatada dos iraquianos malignos. É uma canalhice sem tamanho, como o que fazem agora na Líbia.
O jornalismo é, normalmente, muito mais ficcional que a literatura, com a diferença que a literatura se diz ficção para tentar escoar não-ficção, enquanto o jornalismo faz o inverso. Nesse mundo de ninguém sabe quem come quem não é de se admirar que o leitor fique confuso.
Peguemos, por exemplo, a imagem acima nestas plúmbeas folhas. Em nenhum lugar está escrito que se trata de foto do autor ou algo assim, embora induza a maioria a pensar nisso. Apenas muitos poucos perceberão que se trata, na verdade, de uma ator contratado, uma personagem, como as que passam por estas linhas. O ator tem cerca de meio metro a mais que eu e uns cem quilos a menos. Ele tem a vantagem de não ser careca como eu, mas ainda assim teve que usar uma peruca para se enquadrar no figurino. O visual todo é uma montagem, uma colagem. Os cabelos são uma peruca de Gal Costa, em homenagem ao gosto musical da mãe do autor. A roupa preta foi tirada de um colega de adolescência, o vulgo Iói, figura folclórica dos anos 90 de Floripa. Os óculos vermelhos do bom amigo Paulo, hoje hospitalizado por causa do trânsito selvagem que temos. A barba era para ser mais longa e grisalha, mas as lojas que vendem esses itens não tem um estoque muito variado, então tivemos que nos contentar com essa mesmo.
Em suma a maioria das pessoas, principalmente nos dias de hoje, vive da imagem, tende a acreditar na imagem e achar que seus olhos nunca o enganam , quando são vítimas de fraudes 24 horas por dia. Nunca se deve acreditar em um escritor, embora ele não minta, não me leve a mal, apenas inventa verdades ficcionais, que é aquilo para o que é pago, ou não pago, na maioria das vezes. E pessoanamente finge a dor que deveras sente.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Presidente da Rússia toma chá com o Deep Purple

O presidente russo, Dmitri Medvedev, recebeu os músicos da lendária banda inglesa Deep Purple para tomar chá nesta terça-feira (22) em sua residência em Gorky, nos arredores de Moscou.

Medvedev, de 45 anos, é um notório entusiasta de rock and roll e foi presenteado com um par de baquetas pela banda, da qual confessou ser fã desde a juventude. Ele falou sobre a paixão pela música e contou à imprensa como foi sua curta carreira de DJ em festas de rock, antes de entrar para a vida pública.

- Era uma discoteca estranha, porque o estilo musical principal era o rock pesado.

O presidente lembrou que, antes de tocar nas festas de sua escola em Leningrado, as músicas escolhidas pelo atual presidente tinham que ser aprovadas pela Komsomol, a juventude do Partido Comunista soviético.

Medvedev mostrou sua coleção de equipamentos musicais e discos para o líder e vocalista do Deep Purple, Ian Gillan, incluindo a coleção completa de álbuns da banda. O baterista Ian Paice, por sua vez, deu de presente para Medvedev um par de baquetas.

O presidente da Rússia mostrou-se comovido pelo encontro e agradeceu os presentes dos ídolos de juventude, segundo informações da imprensa russa.

- Quando eu comecei a ouvir Deep Purple, é claro que eu não poderia imaginar que me sentaria com vocês nesta mesa, assim, deste jeito.

Em 2008, o presidente russo já havia se encontrado com os ídolos, antes de chegar à Presidência, durante um concerto da banda na capital Moscou para marcar o aniversário de uma estatal de gás.

Dmitri Medvedev é um notório fã de rock and roll, já tendo declarado diversas vezes seu entusiasmo por bandas de heavy metal como o Deep Purple e Black Sabbath. O ex-presidente e atual primeiro-minitro da Rússia, Vladmir Putin, por sua vez, já afirmou ser fã do grupo sueco Abba.

Pouco antes, o presidente russo havia se reunido com o secretário da Defesa americano, Robert Gates.

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muito surreal, fui pbrigdo a replicar aqui :)
original: http://noticias.r7.com/internacional/noticias/presidente-da-russia-toma-cha-com-o-deep-purple-20110323.html

quinta-feira, 17 de março de 2011

E matas o gato, o rato e o homem


Ilustração por Adorno


Confesso, para meu próprio assombro, certo prazer de andar em cemitérios. Os mortos, na verdade, são bem melhores companhia que os vivos, mais silenciosos, na maioria das vezes. Mas meu assombro vem do fato de que acho condenável essa coisa toda de cemitérios: a carne ali embaixo da terra apodrecendo e poluindo rios, mangues e leitos de água. Tanto do ponto de vista sanitário quanto econômico, a coisa é uma loucura, mais sentido faz a incineração, que também permite os rituais fúnebres e tudo mais que a família do morto queira.
Mas acho que meu gosto por cemitérios vem de três fontes: os locais são geralmente limpos, silenciosos e vazios, um bom local para ler, ainda por cima com enfeites florais; a idéia de que pessoas comuns podem também ter seu monumento público, como as estátuas que tem pela cidade, e ter um epitáfio sobre si enfeitando aquele monumento pelo tempo que a família se dispuser a pagar e, por fim, meu gosto pelos velhos e antiquados filmes de terror.
Quando eu digo velhos, quero dizer os velhos mesmo, preto e branco, de preferência, com ponto extra se tiver sido produzido pela antiga Hammer. É claro que não há muita diferença com os filmes de hoje, ainda se trata de vampiros, lobisomens e bláblábla, exceto que naquela época vilão e mocinho se confrontavam para ganhar a atenção da mocinha e hoje as mulheres aprenderam a quebrar o pau ao invés de ficar gritando, e é a mocinha que enfrenta o vilão em disputa da atenção do mocinho.
Abomino os velórios. Acho que nossos velórios deveriam ser como os irlandeses, um grupo de bêbados amigos do finado enchendo a cara de cerveja a noite inteira e cantando músicas de bebum. Se eu fosse ter um velório assim, não escolheria para ele uma trilha sonora, mas sim uma trilha visual, um grande telão passando filmes direto para as pessoas terem algo para fazer enquanto comem e bebem ao invés de ficarem chorando em cima de mim.
Começaria, é claro, com o Sétimo Selo, clássico de Bergman, que sempre me interessou por causa da derrota proposital para a morte. Em seguida, meia-noite, tacaria a Noite dos mortos-vivos, o original de Romero, com aquele início perfeito dos irmãos no cemitério sendo atacados por zumbis. Então, no meio da madrugada, Nosferatu, de Murnau, só pra não perder a piada de amarrarem meu corpo numa roldana e o erguerem no meio do filme, no mesmo momento que o vampiro se ergue do caixão. Encerraria a madrugada com a Vida de Brian, só pela música final.

segunda-feira, 14 de março de 2011

De Dragões à Sereias

O Discovery vai fazer de novo. O Animal Planet, canal do grupo Discovery, vai apresentar mais um pseudo-documentário, "Sereias" (Mermaids: A Body Found), que vai ao ar no dia 19 de março e que parece seguir os mesmos passos do "Dragons: A Fantasy Made Real". Isto é, criar uma narrativa ficcional, em que uma criatura lendária é descoberta, e através dela mostrar os percalços dos cientistas para tentar compreender o fenômeno de uma forma naturalista - encarando esses seres não como criaturas mágicas, mas como entes biológicos que passaram por um processo evolutivo como todas as demais linhagens de seres vivos - divulgando assim os princípios por trás da biologia comparativa e da história natural. Um bom resumo pode ser encontrado no verbete da wiki para o programa.

A única coisa que me incomoda é que, mais uma vez, vai ter um monte de gente achando que é tudo verdade, ou seja, que realmente descobriram esses animais. Tratando o especial como um documentário real de história natural, um grane furo jornalístico, e não uma docuficção. É uma pena que muita gente fique nas aparências e não perceba que o que importa são os princípios de investigação científica que são ilustrados (mesmo que bem superficialmente) por este tipo de iniciativa. Vamos torcer para desta vez as pessoas usarem um pouco mais o seu senso crítico.

Dia 19, eu vou sentar e me divertir, assistindo o programa e tentando ver o que consigo identificar de anatomia e fisiologia comparada, biomecânica, filogenética etc.

Veja também:

http://animal.discovery.com/convergence/dragons/
http://seancameronmichael.blogspot.com/2010/12/mermaids.html
http://animal.discovery.com/convergence/dragons/inspiration/inspiration.html