Finalmente estávamos reunidos, os três piores assassinos da história. Tatu Louco gostava de ficar quieto num canto afiando seus 219 machados e machadinhas diferentes, enquanto eu e Saci-sem-braços fazíamos a gritaria e esporro desaconselhável em reuniões desse tipo.
Muitos sempre se perguntaram como Saci-sem-braços poderia ser um dos mais eficientes assassinos de todos os tempos, tendo apenas uma perna e nenhum braço. Os que viveram para saber a resposta em geral não sobreviveram para contar a ninguém, exceto eu e Tatu Louco, que somos os amigos mais chegados.
É claro que metade da fama de matador de Saci-sem-braços ele ganhara por causa do seu apelido, pois enquanto todos os jurados de morte ficavam esperando pelo matador que viria pulando numa perna só, ele se aproximava e matava sorrateiramente, depois se afastando com seus vários braços e pernas antes mesmo que notassem o sujeito morto. Taí, está dito, acabei por entregar o jogo, mas espero que não perca a amizade por isso.
O fato é que Saci andava mal nos últimos dias. Aquele cara da tevê era um amador, ele dizia, não merecia estar em todos os canais, dizia com evidente inveja que o corroia. Eu tentava, pela milésima vez, consolá-lo, enquanto Tatu Louco permanecia em silêncio, emitindo apenas o barulho da pedra deslizando contra a lâmina..
Finalmente chegamos lá, disse Saci retomando a cantilena, esse bando de manés queria que o país fica igual ao esteites, e conseguiram, com uma década de atraso, mas já temos também nosso massacre escolar. Eu o consolava, dizia que não era nada, que o que ainda valia era a habilidade dos matadores da velha guarda, que não faziam esse espalhafato todo, não estavam apenas querendo o holofote fácil da mídia, que nunca se fazia de rogada em ceder.
Ele fez que ia dizer alguma coisa mas, então, um soluço lhe escapou. E então um choro, que durou uns 30 segundos até que ele conseguiu controlar. Um silêncio pesava agora entre nós e ninguém se arriscava a dizer mais nada.
Tatu Louco, lá do fundo, cortou finalmente aquele silêncio de embaraço e constrangimento cantando o hino nacional dos EUA, o “Starspanked monkey banner”. Era de se estranhar aquela demonstração vindo de um cara impregnado por um profundo anti-americanismo. Mas eu sabia, assim como ele, que aquela era uma forma de secretamente me agradecer por ter feito Saci-sem-braços calar-se, uma vez que o título original da música era “Para Anacreonte no paraíso”. Abrimos outra cerveja.
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