quinta-feira, 14 de julho de 2011

Pif Paf Bang

Tudo é cor e som e ritmo e violência. Como uma luta de boxe, é preciso manter a base, mover os pés rápidos, avançar, recuar, nocautear. Esquiva, finta, soco. Pif, paf, bang. Num segundo o adversário está ali, no outro está na lona, gemendo. No mundo de hoje, todos são adversários prontos para levar o nocaute, é preciso apenas não perder o ritmo, esquiva-finta-soco, esquiva-finta-soco, pif-paf-bang.
Nas ruas acidentadas da cidade, com crateras de rali, a competição é selvagem, é preciso chegar primeiro, seja lá onde quer que se esteja indo. Há o sujeito que não sabe mais o ritmo da dança e está prestes a perder a luta. Ele não reduz a velocidade e dobra a esquina, ele pára o carro, praticamente estaciona na pista, e espera uns cinco segundos por uma revelação divina ou epifania íntima que o leve a colocar novamente o veículo em movimento e fazer a conversão. O mundo não pode esperar cinco segundos, não mais, a vez dele chega de ser eliminado, pif-paf-bang.
Tem o sujeito na fila do almoço que não consegue decidir se pega 123 grãos de arroz ou 124. Ele pega meia colher, põe um pouco no prato, volta a colher, muda de idéia, pega mais um pouco, dessa vez enchendo bem a colher, mas despeja somente alguns grãos. A fila de famintos atrás dele cresce e o furor da turba se soma à umidade do dia chuvoso. Algo está para acontecer, um linchamento é inevitável, pif-paf-bang.
Nos dias de pressa, acordar e sair, matando a ressaca com um xícara grande de café preto, sem açúcar, o mais amargo possível, pois de doce já basta a vida. O estômago protesta e revira. E almoço suprimido por uma reunião de negócios é a gota d’água, a ofensa final contra o organismo cansado de guerra. A úlcera estoura e o corpo cai ali mesmo, contorcendo de dor, gritando, deixando vazar um fio de sangue pela boca, pif-paf-bang.
O lutador está cansado, não pode baixar a guarda, não pode se contentar em vencer uma luta, é preciso vencer todas até chegar ao título. Mas uma hora ele se distrai, um segundo qualquer e a porrada vem, o supercílio rompe e o olho enche de sangue, ele tenta resistir, mas sabe que é apenas questão de tempo, pif-paf-bang.
No supermercado, fila longa demais, é preciso manter o espírito guerreiro, não descuidar. É na hora de pagar que o olhar me trai e se volta a um pacote balas. O inimigo não perdoa, a luta é cruel, sinto o cano metálico e ouço apenas um clique seco seguido de estouro antes dos meus miolos voarem nas compras, pif-paf-bang.

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